Difícil saber o que é amor. Mais fácil saber o que não é.
Um namorado citou Guimarães Rosa: amor é 'descanso na loucura'. Com ele vivi mais a loucura do que o descanso, mas o aprendizado tem que começar por algum ponto. O vizinho devia estar nesse estágio. Com o tempo vi que ele tinha razão. O namorado, não o vizinho.
Amor é mesmo aquela sensação de voltar para casa. Adormecer lado a lado é a grande prova. No dia seguinte, acordar e sentir que está levando alguém com você. Descobrir um sorriso ridículo no canto da boca. Pronto, encaixou. Feito pecinhas de Lego: diferentes, mas vindas do mesmo mundo. Lego é gostoso. Quebra-cabeça não.
Amor não é desejo.: é feito de. Amor é feito de amor, mas não só. Amor não tem razão. Ninguém ama pelas qualidades do outro, nem apesar dos seus defeitos. Ama porque o outro é o outro e pronto.
Amor é pacote completo. Você sabe que é amor quando se descobre cúmplice. Quando tem a coragem de se mostrar. E de se ver. O outro é um espelho. Vai encarar? Você sabe que é amor quando se entrega. Mas é melhor guardar algo para si mesmo. Amor não pode ser só para o outro.
Amor é um exercício do não ter. Amar e não ter nada em troca. Porque se é amor, não é em troca. Amor não serve para nada, não garante nada. Como as coisas boas da vida.
Amor é presença e é falta. Uma não vive sem a outra. Amor é liberdade. Gostoso é saber que o outro, com tantas opções, escolheu você mais uma vez. O que fazer para que amanhã ele faça a mesma escolha? Mantenha-se distraído.
Amor é feito de hoje. Da arte de não fazer tudo sempre igual. Da construção. Como revestir parede com aquelas pastilhas bem pequenas. No amor é preciso colocar uma por uma. Sem pressa de ver pronto. Para mim, é esse o sentido de amar como se não houvesse amanhã. Menos voraz do que sugere.
Mas posso estar errada. Sou amadora. Quanto mais aprendo, menos sei. Gosto do aprender. Uma convicção: amor é delicadeza. Eu sempre quis falar isso para o vizinho...
Cristiana Guerra
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